sexta-feira, 25 de abril de 2008

Somos livres (uma gaivota voava, voava)

Uma gaivota voava, voava,
asas de vento,
coração de mar.
Como ela, somos livres,
somos livres de voar.

Uma papoila crescia, crescia,
grito vermelho
num campo qualquer.
Como ela somos livres,
somos livres de crescer.

Uma criança dizia, dizia
"quando for grande
não vou combater".
Como ela, somos livres,
somos livres de dizer.

Ermelinda Duarte


Não tenho memória do 25 de Abril. Se me perguntarem: “Que estavas fazer no 25 de Abril?”, posso responder que devia estar a brincar, a dormir, ou a ser mandado comer a sopa. Era pequeno e não me lembro dos acontecimentos.

A primeira ligação ao 25 de Abril foi cantar com a pequenada estes versos de uma das mais famosas melodias pós-revolução. Cantava-mos desafinados, a plenos pulmões e a saltitar pela rua sem saber o seu significado. A melodia era pegadiça e a história da gaivota, bonita. Quando mais tarde a entendi melhor, bem vi que vale a pena cantar a plenos pulmões a alegria de se ser livre.

Hoje vou trauteá-la.
Porque tanto tempo depois daquela revolução que começou a mudar um país, continua a ser necessário outra revolução.
Uma revolução pessoal para ser livre de voar, de crescer e de dizer.


10 comentários:

Anónimo disse...

Eu lembro-me muito bem, apesar de ter 7, quase 8 anos. Lembro-me do antes, devido ao terror da chegada dos PIDES para levaram algum dos meus pais, senão ambos. Não percebia muito bem, mas sabia que a polícia era uma coisa terrível, mais terrível que a morte. Lembro-me do dia, das mães a irem buscar-nos à escola e de eu perguntar à minha se aquilo era uma guerra. A minha diz que não se lembra, mas eu lembro-me. Respondeu-me "não sabemos". Nunca me mentiram. E lembro-me do depois, da alegria, do alívio, da vida a entrarem pela minha casa, do envolvimento político dos meus pais, na comissão de trabalhadores da fábrica, ele; no MDM, ela. Ultimamente tenho vindo regressar receios, sobretudo profissionais, que não gosto de sentir no ar... Abraço, e perdoa a extensão. 25 de Abril sempre!

Socrates daSilva disse...

Rato do campo,
Que belo testemunho! Assim, tem mais força as datas, quando se sente o porquê das coisas e não apenas a alegria de um dia sem fazer nada.
Eu recordo-me vagamente da vida antes e depois do 25 de Abril,estranhamente, não do dia em si. No meu caso tinha menos 2 anos do que tu.
Mas, recordo também o medo que a minha familia tinha de certas posições que podiam valer a prisão. Recordo depois a liberdade de falar e assumir certas posições publicamente.

Socrates daSilva disse...

Ah! Esqueci-me do abraço. Não é uma rotina, é com sinceridade, amigo

João Roque disse...

Eu soube do 25/4 a 26...
Estava no mato, em Moçambique e quando regressei ao quartel, tenho que confessar que à frente da alegria da liberdade, só tive um pensamento, e foi sobre aquela guerra: "esta merda vai acabar, e eu vou para casa, porra!"
Abraço.

Special K disse...

Eu tinha 4 anitos e estava "do outro lado do mar". Por acaso estive para postar um vídeo com esta música. Lembro-me tão bem de a cantar em coro com os meus colegas da escola. Para mim era uma canção infantil, mais tarde fui percebendo o significado da letra.
Um abraço

Manuel Braga Serrano disse...

Como estava a mesitos de nascer, não tenho qq memória. Mas do terror que é esta canção lembro-me. MUITO BEM. Sou reaça, por isso desculpa qq coisinha!!

TUSB disse...

Eu não tinha nascido ainda, o meu pai estava em Angola e a minha mãe a trabalhar na Suiça...

Socrates daSilva disse...

Pinguim,
Estavas mesmo longe e numa guerra! O sentimento de liberdade teve em ti uma intensidade bem maior. É outro testemunho que me ajuda a valorizar a data.
Abração

Special k,
Estamos sintonizados na “festa” que esta música foi para a pequenada! Ai, belos tempos de gritaria nas ruas e nos pátios da escola…
Abração

Manuel Serrano,
Esta canção vale pela história e pelas recordações pessoais. Não creio que ganhasse um “British Music Award”.
Homem! Não tenho nada que te desculpar. És um "reaça" bué de fixe.
Abraço

Unfurry,
No teu caso posso dizer que a revolução ainda estava para aparecer.
Abraço

paulo disse...

Quem não tem memória sou que que ainda nem existia! Mas tenho noção da importância!
A música é tão engraçada e tão metafórica! Gosto de me saber livre de crescer!
Abraço

Socrates daSilva disse...

Paulo,
É essa noção de liberdade evocada de modo tão "naif", que a torna memoravel. Ainda mais para quem andou a "aterrorizar" os vizinhos por gritá-la vezes sem conta.
Abraço